quinta-feira, 26 de maio de 2011

Sentença Subturma 9




Tribunal Administrativo e Fiscal do Circulo de Vila Limpa
Sentença
CONCLUSÃO- 2011.05.26
I-Relatório
“Associação Limpar o Inferno”, pessoa colectiva 507869444, com domicilio na rua Verde Verdinho, nº 1 lote A, 2000-199 Vila Limpa e Carlota Castelo Branco, divorciada, contribuinte n.º 567893454, residente na Rua da Felicidade n.º 18, 1457-003 Vila Limpa intentaram acção administrativa especial contra a “Câmara Municipal de Vila Limpa” – Rua da Câmara nº1, 2000-000 Vila Limpa; a Administração da Região Hidrográfica, com sede no Edifício Fábrica dos Mirandas, Av. Cidade Aeminium, 3000-429 Coimbra, e a Empresa “Porco Feliz, S.A.”, com domicílio na Rua dos Três Porquinhos, nº 39, 2000-200 Vila Limpa, no sentido de impugnar o acto administrativo de dispensa de procedimento de Avaliação de Impacto Ambiental a fim de obter uma declaração de anulabilidade da licença bem como o acto administrativo praticado pelo Presidente da Câmara. Peticiona ainda a condenação da ARH pela omissão do dever de fiscalização e a respectiva responsabilização ambiental da Empresa “Porco Feliz S.A.”, por via de indemnização, actuando esta sem licença de exercício da actividade, legalmente obrigatória. Mais requer a condenação da Empresa “Porco Feliz” à constituição de uma garantia financeira própria que lhe permita assumir a responsabilidade ambiental inerente à actividade por si desenvolvida, não obstante a criação de mecanismos de purificação do ar.
Alegou, para tanto, através da descrição sumária que fez constar da Petição Inicial que:
_ Em Julho de 2009 a Empresa “Porco Feliz, S.A.” iniciou descargas na Ribeira do Inferno e nos terrenos da Sra. Carlota após 2 meses da sua entrada em funcionamento.
_ Perante isto, ao longo de um ano, a “Associação Limpar o Inferno” foi contactada por associados e moradores de Vila Limpa que se queixavam da poluição da Ribeira do Inferno.
_ A “Associação Limpar o Inferno” tentaram, em vão, contactar a Empresa “Porco Feliz”, tendo procedido previamente ao levantamento de testemunhos de pessoas de Vila Limpa.
_ Em Julho de 2010 a Empresa “Porco Feliz, S.A.” referiu que iria aumentar a capacidade da suinicultura de 2800 para 4200 porcos, pretendendo instalar uma Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) com capacidade correspondente a 190.000 hab./eq., no lugar de Paços de Vento, o que provocaria uma maior descarga de efluentes líquidos e um consequente aumento de poluição.
_ O projecto foi aprovado sem qualquer avaliação de impacto ambiental e sem o procedimento de licença ambiental sendo que a construção da ETAR estava sujeita ao Procedimento de Avaliação de Impacto Ambiental.
_ O procedimento, para efeitos de licenciamento não foi cumprido já que não existem circunstâncias especiais.
_ A Associação “Limpar o inferno”, denunciando a situação à ARH, esta não tomou quaisquer medidas.
_ Face a ausência de resposta, a Autora pediu a intervenção do Presidente da Câmara, o qual aprovou em reunião a licença de construção dos projectos da Empresa “Porco Feliz”, iniciando esta, desse modo, a sua actividade.
_ Na sequência de uma descarga efectuada pela Ré “Empresa Porco Feliz”, a plantação de girassóis da Sra. Carlota Castelo Branco situada nas proximidades da Ribeira do Inferno, ficou destruída.

Notificados para tal, os réus deduziram contestação, impugnando tudo quanto alegado na Petição Inicial dizendo a “Empresa Porco Feliz” que:
_ todos os procedimentos legais e processuais foram respeitados e cumpridos, defendendo toda a legalidade na aprovação da licença atribuída pela Câmara Municipal aos novos projectos da Empresa, a qual não foi dispensada.
_ a Empresa tem uma ETAR de modo a não contribuir para a poluição da Ribeira, existindo ainda mais duas fábricas na região com níveis de produção e consequente poluição mais elevados que a Ré.
_ não foram contactos pela “Associação Limpar o Inferno”.
_ a plantação da Sra. Carlota Castelo Branco foi afectada por uma praga de lagartas de girassol.
Mais refere a Administração da Região Hidrográfica que:
_ emitiu titulo de utilização para junção à respectiva licença da Empresa, sendo competente para tal.
_ não foi contactada pela “Associação Limpar o Inferno”, não podendo tomar quaisquer medidas.
_ a Empresa “Porco Feliz” tem vindo a libertar espaçada e cuidadosamente os efluentes líquidos, após peritagem, não comprovando quaisquer sinais de toxicidade da água.
A Câmara Municipal de Vila Limpa contesta dizendo que:
_ foi respeitada a legalidade de todos os procedimentos legais e processuais bem como a aprovação da licença atribuída aos novos projectos da Empresa.
_ não havendo uma alteração substancial da actividade em causa em termos ambientais ou poluentes não haveria necessidade de se proceder a um novo estudo de impacto ambiental.
_ a dispensa foi proferida pelo Ministério do Ambiente no âmbito dos seus poderes legais.
Os autos foram remetidos à distribuição como acção administrativa especial.
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo não enferma de nulidade total.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias; e são legítimas.
Inexistem outras excepções dilatórias ou nulidade parciais de que cumpra conhecer.
***
Apreciando
Atendendo ao alegado pelas partes e aos documentos juntos aos autos, consideram-se assentes por relevantes à decisão a proferir os seguintes factos:
II-Factos Provados:
1. A Empresa “Porco Feliz, S.A.” possui uma suinicultura, com capacidade para 2800 porcos, no concelho de Vila Limpa desde Maio de 2009 sendo cada porco vendido aos 120kgs.
2. A Empresa “Porco Feliz S.A” fez a sua primeira descarga de efluentes líquidos na Ribeira do Inferno em Julho de 2009, bem como descargas regulares de efluentes líquidos na Ribeira do Inferno, por regra, de dois em dois meses.
3. A Empresa “Porco Feliz S.A” anunciou o aumento da capacidade da suinicultura para 4200 porcos.
4. A Associação “Limpar o Inferno” é uma associação ambientalista, sem fins lucrativos, que juntamente com os seus sócios contribui para a promoção da qualidade de vida e para a construção de um futuro sustentável.
5. A Associação “Limpar o Inferno” foi informada pelos seus associados sobre as descargas.
6. A Associação “Limpar o Inferno” contactada por diversos moradores que se queixaram da poluição da Ribeira do Inferno e pediram auxílio para resolver a situação.
7. A Associação “Limpar o Inferno” fez um levantamento oficial da poluição das águas, no dia 25 de Agosto 2010, por um técnico especializado da EALP e os níveis de poluição da Ribeira do Inferno são superiores ao normal tendo elevada poluição da Ribeira do Inferno, resultado a morte de peixes, originando maus cheiros e inundando diversos terrenos nas áreas circundantes.
8. A Administração da Região Hidrográfica é um instituto público periférico integrado na administração indirecta do Estado, sob tutela e superintendência do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
9. A Vila Limpa possui uma fonte municipal cuja utilização é pública e a água considerada potável e utilizada por grande parte da população para os mais diversos fins;
10. A água da fonte tem origem nos lençóis de água subterrâneos;
11. A poluição causada na Ribeira do Inferno e nos terrenos contíguos levou à infiltração dos efluentes líquidos poluentes e à degradação da qualidade da água da fonte, tornando a mesma imprópria para consumo.
12. A poluição impossibilitou a utilização da água para rega dos terrenos circundantes à suinicultura.
13. A Câmara Municipal de Vila Limpa aprovou a licença de construção dos projectos da “Empresa Porco Feliz”, em Outubro de 2010.
14. A Sr.ª Carlota Castelo Branco é habitante de Vila Limpa e possui uma plantação de girassóis situada a 200 metros da suinicultura tendo celebrado um contrato de fornecimento de girassóis com a empresa Bioful, Lda, no valor de 50.000€ por ano, durante 4 anos.
15. Em Março de 2010, a plantação de girassóis ficou destruída, situando esta nas proximidades da Ribeira do Inferno.
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III-Direito
1. O Decreto lei 147/2008 vem estabelecer o regime da responsabilidade subjectiva e objectiva nos termos do qual os operadores-poluidores ficam obrigados a indemnizar os indivíduos lesados pelos danos sofridos por via da lesão de uma componente ambiental.
2. As medidas de reparação dos danos ambientais vêm estabelecidas no anexo V do referido Decreto Lei.
3. Existe obrigatoriedade da constituição de garantias financeiras próprias, sempre que esteja em causa uma actividade sujeita a licença, conforme dispõe o art. 22º e com o anexo III do mesmo diploma.
4. A licença de construção está sujeita a AIA nos termos do art. 1º n.º 3 alínea b) do Decreto lei 69/2000.
5. A dispensa de AIA é da competência do Ministro responsável pela área do Ambiente e do Ministro da tutela, nos termos do art. 3.º do Decreto Lei n.º 69/2000.
6. Compete à AHR, nos termos do art. 9.º n.º 6 alínea b) da Lei 58/2005 e art. 13º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 226-A/2007, decidir sobre a emissão e emitir os títulos de utilização dos recursos hídricos e fiscalizar essa utilização.
7. As competências atribuídas à ARH vêm legalmente previstas na Lei n.º 58/2005.
8. O art. 3º n.º4 do Decreto-Lei 69/2000 de 3 de Maio serve para dispensar AIA no âmbito de projecto de expansão da actividade económica, sendo proferida por Despacho do Ambiente ao abrigo do mesmo artigo.
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IV-Decisão
Face ao exposto, julgo a presente acção improcedente relativamente à Administração da Região Hidrográfica, absolvendo a Ré da instância.
No que respeita à Ré Empresa “Porco Feliz” não se consideram procedentes os factos invocados pelos Autores, não havendo resultados de peritagem conclusivos que nos permitam condenar a Empresa a indemnizar Sra. Carlota Castelo Branco por insuficiente nexo de causalidade, condenando a Ré apenas à constituição de uma garantia financeira própria que lhe permita assumir a responsabilidade ambiental inerente à actividade por si desenvolvida.
A Câmara Municipal de Vila Limpa, por manifesta incompetência do Presidente da Câmara para declarar dispensa de AIA encontra-se isenta de responsabilidade com a consequente absolvição da instância.

Custas pelos autores.
Registe e notifique.
26 de Maio de 2011
Os Juízes
Ana Filipa Rebelo
Catarina Mourato
Duarte Figueiredo
João Rodrigues
Maria João Mendes
(Subturma 9)

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