MINISTÉRIO PÚBLICO
PROCURADORIA DA COMARCA DE VILA LIMPA
Parecer nº 21/2011
Processo nº 7721/2011
Exmo. Senhor Dr. Juiz,
De acordo com o disposto no art. 85º CPTA e nos parâmetros do art. 219º da Constituição, vem o Ministério Público intervir, emitindo parecer sobre o processo sub judice, com os seguintes fundamentos:
A autora, Associação Ambientalista “Limpar o Inferno” (AALI) pede:
a) Ser declarado nulo o acto administrativo de dispensa da AIA;
b) Ser anulado o acto administrativo posteriormente praticado pelo Presidente da Câmara de Vila Limpa, mais concretamente, a emissão de licença para o inicio das obras da construção da ETAR;
c) Ser a Administração condenada pela omissão do dever de fiscalização;
d) Ser a empresa “Porco Feliz S.A.” condenada a reparar os danos causados na Ribeira do Inferno por via de indemnização.
a) Quanto à declaração de nulidade do acto administrativo de dispensa de AIA
Relativamente à questão de poder ou não existir dispensa do procedimento de AIA, temos de atender ao art. 3º do D-L 69/2000, que prevê essa possibilidade em circunstâncias excepcionais e devidamente fundamentadas, sendo que tem de haver iniciativa do proponente e despacho do Ministro responsável pela área do ambiente e do Ministro da Tutela.
A construção da ETAR está sujeita a AIA nos termos do art.1º/3, a) do D-L 69/2000 e do ponto 13 do Anexo I já que a referida ETAR, a ser construída, vai ter uma capacidade superior a 150.000 ha./eq.
No nosso entendimento, após uma cuidada análise do parecer de AIA nº 26/28, constante do documento 6 apresentado pela empresa Porco Feliz S.A. ao tribunal administrativo de círculo de Vila Limpa, esta situação cabe na excepção prevista no art. 3º do D-L 197/2005, isto porque:
“Circunstâncias excepcionais” é um conceito cuja definição legal não existe tendo a Administração discricionariedade no preenchimento do mesmo, logo, os factos afirmados no parecer são procedentes.
Tendo em conta que a empresa Porco Feliz S.A. se compromete a minimizar os danos ambientais e ecológicos decorrentes da actividade pecuária através de um investimento muito elevado numa ETAR, que servirá, não só a empresa Porco Feliz S.A., mas também toda a região de Vila Limpa, levando a cabo o tratamento das águas residuais de origem doméstica (esgotos) e industriais (despejos industriais). Isto irá guarnecer o princípio do desenvolvimento sustentável, assim como o princípio da prevenção, adoptando medidas tanto actuais como futuras a fim de garantir uma melhor qualidade do meio ambiente de Vila Limpa.
b) Quanto ao pedido de anulação do acto administrativo posteriormente praticado pelo Presidente da Câmara
Segundo o disposto no art. 64º/5, a) da Lei 169/99, a competência para conceder licenças de construção, utilização, conservação ou demolição de edifícios, assim como para estabelecimentos insalubres, incómodos, perigosos ou tóxicos, pertence à Câmara Municipal, podendo esta competência ser delegada no seu Presidente, por via do art. 65º do supra citado diploma.
Assim, tendo a aprovação da licença de construção atribuída à empresa Porco Feliz S.A. sido conferida por deliberação da Câmara Municipal de Vila Limpa, ao abrigo do art. 64º/5, a) da Lei 169/99 e do art. 5º/1 do Regime Jurídico de Urbanização e Edificação, esta é válida pelo que o pedido de anulação do acto administrativo não é procedente.
c) Quanto ao pedido de condenação da administração pela omissão do dever de fiscalização
Em relação ao pedido da ARH ser condenada por violação do dever de fiscalização temos, antes de mais, de atender ao despacho nº 257/2010 proferido pelo Presidente da ARH do Norte, no qual ele delega a responsabilidade de fiscalizar e monitorizar as actividades de cariz ambiental do Concelho de Vila Limpa à ARH do Centro.
Segundo o art. 7º/1, b) da lei 58/2005, as instituições da ARH que devem que devem exercer as competências desta lei são as ARH que prosseguem a atribuição de gestão das águas, incluindo o planeamento, licenciamento e fiscalização.
Atendendo ao art. 90º/1, a) da referida lei, a fiscalização e a vigilância dos recursos hídricos, disponham ou não de licença, conforme também o nº 2 deste artigo, pertencem à ARH com jurisdição na área bem como às entidades a quem tenha sido atribuída a competência, pelo que não tendo encontrado qualquer oposição na lei quanto ao facto de ter havido delegação de competências entre as ARH do Norte e do Centro, a ARH do Centro era competente para fiscalizar as actividades de cariz ambiental no Concelho de Vila Limpa. Desta forma, a ARH do Centro deveria ser condenada pela omissão do dever de fiscalização.
É ainda relevante referir que a responsabilidade da ARH do Centro deve ser apreciada à luz da Lei 67/2007.
d) Quanto à condenação da empresa Porco Feliz S.A. ao pagamento de uma indemnização
Em relação ao facto de a empresa Porco Feliz S.A. ser condenada a reparar os danos causados na Ribeira do Inferno por via de indemnização deve-se atender, antes de mais, ao D-L 147/2008.
Neste âmbito, tem aplicação o art. 3º, uma vez que a actividade lesiva é imputada a uma pessoa colectiva, tendo assim responsabilidade subjectiva nos termos do art. 8º do referido diploma.
Como tal, os argumentos apresentados pela empresa Porco Feliz S.A. não devem proceder, sendo que, esta empresa deve ser condenada à reparação dos danos causados na Ribeira do Inferno através de uma indemnização, pois, pelos factos apresentados, não é possível proceder à reconstituição natural.
Relativamente ao caso da indemnização reverter para o fundo de limpezas e preservação das áreas afectadas por semelhantes problemas, como o ambiente não é susceptível de apropriação individual, esta indemnização só pode ser concedida se ela reverter para um fundo de recuperação ambiental.
A autora, Carlota Castelo Branco pede:
a) A responsabilização subjectiva por violação ilícita e culposa, constituindo a empresa Porco Feliz S.A. no dever de reconstituir a plantação e pela indemnização por danos patrimoniais no valor de 50.000 €, acrescidos de 15.375 € por danos emergentes;
b) A responsabilização da Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P. por um dano resultante de omissão ilícita no exercício da função administrativa, que lhe era devida;
c) A declaração de nulidade do acto ilegalmente emitido pela Câmara Municipal de Vila Limpa.
a) Quanto à responsabilização subjectiva por violação ilícita e culposa, constituindo a empresa Porco Feliz S.A. no dever de reconstituir a plantação e pela indemnização por danos patrimoniais no valor de 50.000 €, acrescidos de 15.375 € por danos emergentes
Em relação à responsabilização subjectiva, a empresa Porco Feliz S.A. devia indemnizar a autora pelos danos patrimoniais avalizados em cerca de 65.375 € (art. 3º do D-L 147/2008).
Quanto ao dever de reconstituir a plantação de girassol, devemos atender ao art. 11º/1, n) do D-L 147/2008, em que são definidas as medidas de reparação, bem como aos art. 13º, 15º, e 16º do mesmo diploma, reconstituindo assim a plantação de girassol pertencente à autora.
Deve-se considerar, ainda, o art. 25º de modo a que seja exercida a fiscalização do cumprimento das disposições legais supra mencionadas pela Inspecção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território, pela autoridade competente e pelo Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente da Guarda Nacional Republicana. Isto para que, efectivamente, a autora volte a ter a possibilidade de produzir novamente o biodisel.
b) Quanto à responsabilização da Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P. por um dano resultante de omissão ilícita no exercício da função administrativa, que lhe era devida
Foi anteriormente analisada esta questão no ponto c) deste parecer, pelo que o referido nesse ponto também se aplica a este pedido devendo o mesmo ser, novamente, levado em conta.
A ARH do Centro deveria ser condenada pela omissão do dever de fiscalização por via da lei 67/2007.
c) Quanto à declaração de nulidade do acto ilegalmente emitido pela Câmara Municipal de Vila Limpa
Mais uma vez o Ministério Público analisou anteriormente a questão suscitada nesta conjuntura, aquando do pedido efectuado pela Associação Ambientalista Limpar o Inferno no ponto a) desse pedido, tendo concluído que o acto emitido pela Câmara Municipal de Vila Limpa é válido pelo que o pedido de anulação do acto não procede uma vez que a carência de AIA encontrava-se justificada, preenchendo os requisitos do art. 3º do D-L 197/2005.
Nestes termos e pelo exposto, atendendo ao disposto nas peças processuais vindas ao nosso poder, o Ministério Público considera:
Quanto aos pedidos da Associação Ambientalista “Limpar o Inferno” (AALI):
a) Deve improceder o pedido formulado em a)
b) Deve improceder o pedido formulado em b)
c) Deve improceder o pedido formulado em c) em relação à ARH do Norte, visto que a competência é da ARH do Centro
d) Deve proceder o pedido formulado em d)
Quanto aos pedidos da autora, Carlota Castelo Branco:
a) Devem proceder ambos os pedidos formulados em a)
b) Deve improceder o pedido formulado em b) em relação à ARH do Norte, visto que a competência é da ARH do Centro
c) Deve improceder o pedido formulado em c)
Vila Limpa, 22 de Maio de 2011
Os procuradores do Ministério Público,
Bárbara Duarte
Nuno Evangelista
Sara Martins
Sofia Assunção
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